Todos os medicamentos de uso humano poderão ficar isentos de impostos, ou seja, dos tributos desvinculados do financiamento de atividades específicas do setor público. É o que determina a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 2/2015, do senador Reguffe (sem partido-DF), aprovada na quarta-feira, 24 de maio, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). O texto segue agora para exame em Plenário, onde passará por discussão e votação em dois turnos.
O autor esclarece na justificação que o objetivo é diminuir o valor dos medicamentos, garantindo mais condições de acesso aos brasileiros a produtos essenciais por sua natureza. “O que observamos hoje em dia é que os remédios são considerados como uma fonte de receita tributária fácil de arrecadar, fazendo com que muitas das vezes se busque, a partir da sua alta tributação, fazer ‘caixa’ para os governos”, diz o senador na justificativa da proposta.
O texto teve como relatora a senadora Simone Tebet (PMDB-MS), que sugeriu emendas. No projeto original, Reguffe defende a alteração do artigo 150 da Constituição Federal para que todos os medicamentos de uso humano fiquem isentos de qualquer tipo de tributo. Isso livraria os produtos inclusive da cobrança das contribuições sociais instituídas pelo governo federal. A relatora apresentou emenda alterando o texto para que a imunidade seja aplicada apenas aos impostos, que são arrecadados para cobrir qualquer tipo de despesa pública, a exemplo do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS), na esfera estadual.
Transição
Outra emenda define uma transição, para que a aplicação de imunidade ocorra de forma gradual. A ideia é que haja uma redução anual de 20% das alíquotas incidentes sobre medicamentos na data de publicação da futura emenda constitucional, até atingir 100% dentro de cinco anos.
A relatora acrescentou ainda ao texto dispositivo que determina a análise, por meio de órgãos competentes do Poder Executivo federal, dos preços dos medicamentos. A intenção é verificar se a imunidade tributária adotada estará sendo realmente repassada ao valor dos produtos.
Perenidade
Simone esclareceu, em relação ao Imposto sobre Importação (II), que hoje as alíquotas aplicadas a remédios são baixas e podem até chegar a zero, tratamento dado a produtos essenciais. Em função da tributação atual, frisou que esse imposto não repercute nos preços de venda ao consumidor final. Contudo, salientou que a aprovação da PEC deixará perene o benefício fiscal.
Quanto às alíquotas internas do ICMS incidentes sobre medicamentos, Simone observou que podem alcançar 20%. Porém, em virtude de o ICMS ser calculado “por dentro” (o valor do tributo é computado na base de cálculo do próprio imposto), na prática a alíquota efetiva incidente na operação é maior que a nominal.
A relatora salienta ainda que o ICMS, a exemplo do IPI, também deve ser cobrado com base no critério da seletividade, o que exigiria a adoção de alíquotas menores ou mesmo isenção, devido à essencialidade dos remédios. Apesar disso, ela diz que os estados nem sempre seguem esse princípio constitucional para todos os medicamentos.
Contribuições
Ao comentar sobre as contribuições sociais, que continuarão a incidir sobre os remédios, Simone justificou que estender a imunidade a esses tributos significaria retirar receitas da Seguridade Social, que engloba saúde, previdência e assistência social. A Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) é fonte específica para o financiamento dessas despesas.
As contribuições ainda incluem, entre outras, as que financiam o Programa de Integração Social (PIS) e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep).
Alquimia
Em defesa da proposta de Reguffe, a senadora observou que é inócua a ciência médica, “se muita gente ainda morre pela falta de acesso ao remédio, e não pela doença que inspirou a sua alquimia e calculou a sua posologia”.
“Nos males físicos e existenciais, se a dor é consequência, a falta de acesso ao remédio não pode continuar sendo causa. Por isso, todo remédio que tarda em se tornar um contraponto à dor e à morte tem seu prazo de validade vencido“, disse a senadora.
Antecedente
Em novembro de 2014, a PEC 115/2011, que também proibia a cobrança de impostos sobre medicamentos de uso humano, foi rejeitada pela CCJ.
A PEC era uma iniciativa do senador Paulo Bauer (PSDB-SC) e contou com o voto pela aprovação do relator, senador Luiz Henrique (PMDB-SC), na forma de substitutivo. Mas prevaleceu na CCJ a posição do governo, contrária à proposta.
Na ocasião, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-RR) afirmou que a redução de carga tributária prevista na PEC resultaria em impacto negativo sobre os orçamentos estaduais e municipais.