A 22ª edição do Fórum de Entidades Médicas de Santa Catarina (FEMESC), realizado em Brusque nos dias 5 e 6 de julho, teve como principais pontos a criação de grupos de trabalho para tratarem respectivamente sobre a judicialização e financiamento em saúde. Os temas foram os pontos dos debates que reuniu médicos, dirigentes de entidades médicas, representantes do judiciário, ministério público, procuradoria geral do Estado, secretaria de Estado da Saúde, deputados federal e estadual.
“Foi um encontro muito importante principalmente porque são temas recorrentes em nossos debates. Evoluímos em muitos pontos mas temos certeza que as entidades médicas têm muito a contribuir tendo em vista que os médicos são parte muito importantes no processo de promoção de saúde de qualidade. Não é somente um problema de gestão. É de financiamento também. E o bom uso de recursos públicos tem que estar sempre na nossa proposta de discussão”, aponta o presidente do SIMESC, Cyro Soncini.
Para o presidente do CRM-SC, Marcelo Linhares o debate sobre “a boa prática médica e o financiamento em saúde precisam estar sempre em pauta. E o FEMESC alcançou mais uma vez esse objetivo”.
O presidente da ACM, Ademar Paes Júnior cita que “o assunto sempre retorna tendo em vista a crise do sistema de saúde. O financiamento em saúde precisa ser prioridade como forma de defendermos a vida dos cidadãos catarinenses. O FEMESC reforça essa temática que é comum a todas as entidades médicas”.
Licinio Alcântara, presidente do SIMERSUL frisou que os debates mereciam sair do papel. “Ao avançarmos na criação de núcleos de discussões, observamos que é possível sim a mudança. Cada entidade que aqui esteve sabe de sua função e missão e com a reunião de ideias em busca de um único propósito, vamos avançar”.
Representando a ACAMESC, Armando D’Acampora destacou que o FEMESC reafirma sua importância. “Há mais de uma década o FEMESC fala sobre judicialização e o financiamento em saúde. E vejo que evoluímos nessa edição quando nos dispomos a ampliar o debate. Tenho certeza que frutos serão colhidos em prol da saúde”.
Judicialização na Saúde
A primeira mesa redonda do FEMESC foi sobre Judicialização na Saúde – os papeis das entidades. O vice-presidente do SIMESC, Leopoldo Alberto Back foi o primeiro a falar e apresentou a visão do médico sobre essa situação. “É um assunto que gera muita celeuma tendo em vista os problemas gerados ao governo e à sociedade. É importante destacar que meu papel como médico é fazer o melhor para o meu paciente mesmo quando isso representar a informação a ele e seus familiares de um medicamento não disponível na rede pública. Há medicamentos em oncologia com efeitos colaterais mais amenos e eu não posso me omitir”, disse.
O secretário adjunto da Saúde, André Motta Ribeiro destacou o problema da judicialização para o Estado. “Temos consciência que o produto que entregamos tem que melhorar muito. E é preciso que estejamos todos conscientes de que um medicamento judicializado beneficia somente um paciente. Precisamos rever essas questões principalmente para medicamentos que ainda não têm comprovação garantida”.
A procuradora do Estado e coordenadora do Núcleo de Assistência à Saúde, Flávia Dreher de Araújo, frisou que a função da PGE-SC é defender o Estado. “E para isso, vamos sim questionar as judicializações em busca de uma defesa técnica. A lista de medicamentos pode ser tecnicamente limitada, mas é bom sempre destacar que nós também somos limitados em termos de recursos. Às vezes os deparamos com o pedido de medicamentos que estão fazendo as pessoas de cobaias. Em outros países isso não acontece. Há sim um exagero na judicialização”, disse.
Douglas Roberto Martins, promotor de justiça do Núcleo de Saúde do Ministério Público lembrou que o artigo 196 da Constituição Federal, que dá acesso e garantia de saúde pública e de qualidade a todos os cidadãos, teve que ser repensado nos últimos anos. “Em 2016 foram 2188 decisões favoráveis. No ano seguinte 1.774 e ano passado, 1.162. Os critérios para fornecer os medicamentos via justiça com protocolos técnicos e indicações tem que ser uma realidade. Quando o problema de saúde chega na judicialização é porque temos falhas no sistema. E essas falhas precisam ser sanadas”.
O desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Paulo Henrique Moritz Martins da Silva comento que a vida de maneira geral está judicializada. “Não temos esse problema somente na saúde. Temos na educação com a falta de vagas em creches, por exemplo. Por conta de uma defasagem das políticas públicas, o judiciário avança o sinal de maneira preocupante e determina, por exemplo, que determinada pessoa seja atendida em um hospital, sem que o mesmo tenha estrutura para isso. O mesmo vale para os médicos que precisam estar atentos às políticas públicas na hora de prescrever. A corda esticou demais e a melhor forma de encontrarmos uma solução para isso é essa aproximação entre os agentes envolvidos”, destacou.
Perspectivas na saúde pública
Na abertura do FEMESC, a deputada federal Carmen Zanotto falou sobre as perspectivas na saúde pública catarinense. Como presidente da Frente Parlamentar da Saúde e ex-gestora da SES, falou sobre sua experiência na área e sobre a importância da atualização da tabela SUS.
“Estamos há 20 anos sem atualização de alguns procedimentos na tabela SUS o que deixa mais complexa a garantia de assistência em saúde. Enfrentar o subfinanciamento e gestão não pode ser uma prática acanhada. E é impossível atualizarmos a tabela sem termos mais recursos para investimento”, apontou.
Carmen falou do que está sendo colocado em prática pelo Ministério da Saúde, como a reformatação do programa Mais Médicos e à distribuição de médicos pelo Brasil. “Os grandes desafios nos Estados e municípios são habilitar serviços que estão em funcionamento, abertura de novos leitos e ampliação de hospitais, enfrentar a redução da obrigatoriedade do repasse aqui em SC, saldar dívidas, garantir repasse aos hospitais filantrópicos, qualificar os hospitais, buscar a diferença entre o produzido e o recebido, entre outros”, citou.
Sobre a manutenção de emendas impositivas da bancada catarinense em Brasília, a deputada federal informou que houve um incremento de R$ 81 milhões em 2018 para R$ 147 milhões para esse ano. “Estava prevista uma drástica redução, mas o bom senso prevaleceu quando avaliamos a destinação de recursos para áreas onde não haveria o mesmo impacto. É uma sinalização positiva para o nosso Estado”, destacou.
Financiamento da saúde em SC
A última mesa redonda do FEMESC tratou sobre financiamento da saúde no Estado. O secretário adjunto da SES, André Motta Ribeiro apresentou ações para melhorar os serviços para fazer mais por menos. “Na fotografia somos bons, mas precisamos discutir processos. Temos que nos permitir melhorar. Avançamos quando por exemplo, com a licitação digital, economizamos R$ 1 milhão/mês com o oxigênio de uso domiciliar. Precisamos aplicar melhor os recursos para fazermos mais por nossos serviços”.
O deputado estadual Vicente Caropreso falou sobre usa experiência como secretário de Estado da Saúde e sua vivência em outras esferas do gerenciamento em saúde. “Faz com que a gente cresça e se aproxime das realidades e do que é preciso fazer”, apontou. Deixou como desafios a serem superados melhorar a tecnologia em saúde e reduzir a burocracia. “Temos outros enfrentamentos também que é uma gestão mais eficiente e superar situações como esse retrocesso da população em participar de campanhas de vacinação. Ao invés de avançarmos em prevenção, fomos surpreendidos com casos de sarampo, sífilis, febre amarela, dengue. Temos que melhorar e esse Fórum nos apresenta essa possibilidade de discussão e ampliação das forças para isso”, apontou.
O promotor de justiça Douglas Roberto Martins comentou sobre ações do Ministério Público que contribuem para melhor aplicação dos recursos, como a auditoria sobre o sobreaviso, quando foram identificadas situações que não justificavam a remuneração dos profissionais. “Os pagamentos e repasses em saúde precisam ser regulares, automáticos, sistemáticos e obrigatórios como é na educação. Na educação, quando o gestor não aplica, é enquadrado na Lei de Responsabilidade Fiscal. Na saúde o gestor pode escolher onde investir, o que pagar e como pagar. E não é aceitável que reajustes e promoções de profissionais sejam feitas por sobreaviso. Não é a forma correta apesar de todos sabermos que são merecidas”, afirmou.
João Paulo de Souza Carneiro, procurador do Estado de SC, destacou que a interferência do judiciário privilegia uma pequena parcela da população que tem acesso à saúde pública. “Um medicamento que tem custo de R$ 8 mil mensal beneficia somente um paciente e esse medicamento não tem garantia de resultados seja de cura ou de melhoria da qualidade de vida do paciente. Mesmo assim, a justiça determina que o Estado financie isso. E decisão judicial tem que ser cumprida em detrimento de outros milhares de pacientes que precisam de acesso a serviços que acabam ficando comprometidos por uma situação como essa”, apontou.
Nos próximos dias será divulgada a Carta de Brusque, com todas as recomendações apontadas no evento que em 2020 será realizado em Criciúma.