Uma pessoa soropositiva tratada de forma eficaz não transmite o vírus da aids – aponta um estudo, corroborando a afirmação feita há anos por organizações que lutam contra o HIV, e demonstra a importância de um melhor acesso ao tratamento para deter a epidemia.
Realizada em 14 países europeus, essa ampla pesquisa acompanhou por oito anos cerca de mil casais homossexuais masculinos que tiveram relações sexuais sem proteção. Além disso, um parceiro era soropositivo, mas com uma carga viral indetectável, graças aos medicamentos antirretrovirais.
Resultado: nenhum caso de transmissão de HIV foi observado nesses casais, conclui o artigo, publicado na revista médica britânica “The Lancet”.
Essas conclusões reforçam aquelas, às quais os autores já haviam chegado na primeira fase do estudo, publicado em 2016. Nenhuma contaminação havia sido constatada após 1,3 ano de acompanhamento de 900 casais hetero e homossexuais, mas os pesquisadores permaneciam prudentes.
Os pesquisadores consideram que não se podia excluir totalmente um risco de transmissão, em particular por relações anais em um intervalo temporal mais longo.
Desta vez, “nossos resultados dão uma prova conclusiva para os homens gays de que o risco de transmissão do HIV com uma terapia antirretroviral que suprime a carga viral é de zero”, afirma Alison Rodger, professora na University College London, que codirigiu o estudo.
‘Indetectável = Intransmissível’
“Esta mensagem poderosa pode ajudar a pôr fim à pandemia de HIV, evitando a transmissão do vírus e combatendo a estigmatização e a discriminação enfrentadas por muitas pessoas que vivem com o HIV”, acrescenta a pesquisadora.
O princípio “U=U” (“Indetectável=Intransmissível”), segundo o qual uma pessoa sob tratamento não transmite mais o vírus, é defendido há vários anos pelas associações de luta contra a aids.
Apesar disso, “os médicos generalistas, que não são especializados nisso, mas que acompanham a maioria dos pacientes com HIV, sempre dizem que há ‘menos risco’ de transmissão”, comenta o presidente da associação francesa Aides, Aurélien Beaucamp.
O estudo “pode nos ajudar a passar a mensagem de que ‘não há risco’”, acrescentou.
Essa ideia apareceu pela primeira vez em 2008, em um relatório da Comissão federal suíça para Problemas ligados à aids (CFSS). Depois de uma onda inicial de oposição, passou a fazer parte da estratégia de organizações como a ONUaids, que tem como meta erradicar a epidemia até 2030, com base em três pilares: que 90% das pessoas contaminadas tenham conhecimento de sua soropositividade, que 90% delas tenham acesso aos antirretrovirais e que 90% das pessoas sob tratamento tenham uma carga viral indetectável.
O caminho a seguir ainda é longo. Menos de dois terços (59%) dos soropositivos estão em tratamento hoje, com disparidades significativas entre países centrais e periféricos.
Desde o início da epidemia, nos anos 1980, 78 milhões de pessoas foram infectadas pelo vírus HIV e 35 milhões morreram. Apesar dos avanços na prevenção e nos tratamentos, ainda há 1,8 milhão de novos contágios e quase um milhão de óbitos por ano, segundo a ONUaids.
Fonte: Folha de Pernambuco