Neste Dia do Médico (18 de outubro), o Conselho Federal de Medicina (CFM) oferece à comunidade médica um presente especial. Será lançado o blog “Humanos”, uma plataforma criada pela autarquia com o objetivo de estimular a sensibilidade do médico, promover o exercício humanístico da profissão e divulgar as bases para fortalecer as reflexões e ensinamentos sobre questões éticas e bioéticas, entre outros objetivos.
“Humanos” será um espaço de publicação de artigos, reportagens, conferências, depoimentos, comentários, biografias e resenhas sobre diferentes formas de manifestações artísticas. Para o coordenador da Comissão de Humanidades Médicas e secretário-geral do CFM, Henrique Batista e Silva, essa nova ferramenta auxiliará no aperfeiçoamento do processo da formação dos médicos ao destacar aspectos considerados subjetivos e que ultrapassam as análises técnica, científica e clínica.
Segundo ressaltou Silva, a Medicina é um campo permeado por incertezas, limites e indeterminações quando o assunto é curar, mas sempre pode oferecer, através do cuidado, alívio para o sofrimento. “O adoecimento é uma condição sui generis que provoca alteração no mundo de valores do paciente, o deixando em posição de fragilidade e transformação”, diz. Por isso, entende ser fundamental estimular a sensibilidade humana e humanística dos profissionais, o que terá impacto positivo na sua relação com os pacientes.
“O contato com as artes ajuda a desenvolver e consolidar hábitos essenciais para o cuidado. Com elas, desenvolve-se a observação, análise, empatia e autorreflexão”, explica o secretário do CFM. Análise de textos sobre mitologia, história, biografias de figuras célebres e leitura de autores consagrados, além de uso de fotos, pinturas, músicas e filmes, são algumas das possibilidades para o estímulo dessas reflexões e que estarão presentes no novo blog.
Concepção – A proposta de criação do blog “Humanos” partiu da Comissão de Humanidades Médicas do CFM, composta por conselheiros, docentes, titulares de Academias de Medicina e médicos de diversas especialidades interessados no tema. A intenção foi, com a ajuda do novo canal, abrir uma interface de diálogo construtivo com os médicos e estudantes de medicina, além de fomentar as reflexões esperadas.
De acordo com Henrique Batista e Silva, durante a gestão 2009-2014, se percebeu a necessidade de abertura de um espaço voltado para médicos, estudiosos e instituições que se dedicam ao campo chamado de Medicina Humanística. Nessa época, em setembro de 2010, foi realizado o I Congresso Brasileiro de Humanidades em Medicina, no Rio de Janeiro (RJ).
A ocasião foi extremamente importante para a discussão do tema e amadureceu alguns debates conceituais. “O conceito de humanidades em medicina defendido pela comissão leva em conta aspectos como a sensibilidade do médico, que pode ser despertada no contato com produções artísticas de um modo geral. Cinema, literatura e pinturas são meios pelos quais os profissionais acessam temas extremamente humanos, trazendo de volta o humanismo concebido por Francesco Petrarca, ainda no início do período Renascentista”, explica.
Desde que passou a estimular uma reflexão em torno dessa temática, a autarquia já organizou seis congressos de humanidades. O último aconteceu em 2017, em Brasília (DF). As sucessivas edições têm se consolidado com o aumento no número de participantes, ampliação dos temas, além da mudança do formato do congresso, com possibilidade da apresentação de trabalhos científicos, com relatos de experiência e estudos qualitativos.
Além disso, nos últimos anos, a Comissão que se dedica ao tema tem prosseguido suas atividades de modo regular e contínuo “com um progresso muito claro e definido”, conforme destaca o conselheiro Henrique Batista e Silva. “Passamos a contar também com a colaboração de associações, como a Academia Nacional de Medicina (ANM), a Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), além de importantes entidades estudantis e médicos renomados na área de humanidades”, relaciona.
Para o grupo idealizador do projeto, é preciso reconhecer a importância de o médico agregar ao seu rol de conhecimentos referências artísticas e culturais, pois elas proporcionam ensinamentos muito importantes para a compreensão do ser humano. “São valores que todos buscam, como os anseios de vida em plenitude, bem-estar integral e felicidade autêntica. Esses valores ajudam os profissionais a exercerem o princípio ético da alteridade, que é ver o outro em suas diferenças como um ser essencialmente semelhante a si mesmo”, diz Péricles Brandão, um dos membros da Comissão.
Leia a seguir trechos da entrevista com o coordenador da Comissão de Humanidades Médicas e conselheiro federal por Sergipe, Henrique Batista:
CFM: Quais anseios da Comissão que culminaram com a criação do blog Humanos?
Henrique Batista (HB): Esse projeto veio da necessidade de se abrir um canal de comunicação com professores, personalidades, instituições e médicos – tanto aqueles experientes, como os recém-formados ou estudantes – que partilham o interesse por esse campo do conhecimento necessário à formação médica e ao desenvolvimento da atividade profissional. Nosso intuito é congregar esses atores, que fazem a medicina e desenvolvem a sua formação, para que possamos disponibilizar uma série de materiais com o objetivo de tornar o médico sensível ao exercício da medicina de modo humanístico.
CFM: Qual tem sido o foco dos trabalhos da Comissão?
HB: Nas reuniões, abordamos principalmente a importância das humanidades médicas e a formação do futuro profissional. No nosso entendimento, essa formação deve atender às Diretrizes Curriculares Nacionais, mas também deve possibilitar um enfoque humanista além da formação técnico-científica, ou seja, um aprofundamento nas questões de ética médica e nos componentes epistemológicos do ponto de vista da moralidade. Temos convicção de que o contato com as artes pode contribuir para o aprimoramento da formação médica, evidentemente somado à obtenção de outros conhecimentos. A medicina é uma profissão que depende de incorporação tecnológica, mas é importante que ela possa ser aplicada com a sensibilidade que o paciente exige enquanto pessoa que dispõe de dignidade humana.
CFM: O senhor acha que o estudante de medicina tem acesso a esse tipo de conteúdo? Qual o papel dos professores para sensibilizar esses alunos?
HB: Acreditamos firmemente que os estudantes de medicina têm acesso a esse conteúdo. Nós somos otimistas e sabemos que o estudante, quando ingressa no curso de medicina, carrega em si o sentimento de compaixão, o desejo de ajudar o próximo e aproximar-se do ser humano, inclusive de ajudar na cura de doenças que hoje são tidas como não-curáveis. Mas, durante sua formação, pela necessidade de ter uma formação dialética, acaba privilegiando os conhecimentos e habilidades técnico-científicas e deixando de ver o paciente no seu todo, inclusive em suas particularidades, suas sensibilidades, no seu subjetivo.
CFM: Como o blog pode contribuir para que os profissionais e estudantes despertem para esse viés tão importante da Medicina?
HB: Nosso entendimento é de que, com esse blog, o médico terá mais um instrumento para resgatar esses valores que estão adormecidos dentro dele, para reavivar o anseio de ajudar o próximo numa perspectiva mais humanística e para o bem do paciente. Um dos nossos maiores objetivos é estimular os professores e coordenadores dos cursos de medicina para que possam trabalhar com disciplinas que tenham um cunho humanístico, como história da medicina, bioética, psicologia médica, as artes de um modo geral, comunicação, ética e outras disciplinas que se dirijam ao âmago da moralidade do ser humano. Nós acreditamos que os professores são peças fundamentais no incentivo e na ênfase da formação do médico na questão humanística.
Fonte: CFM