A Prefeitura de Sorocaba negou a informação, divulgada em grupos de WhatsApp e na página do vereador Hudson Pessini (MDB) no Facebook, de que o prefeito José Crespo (DEM) teria determinado ao coordenador da Policlínica Municipal de Sorocaba, Paulo Roberto Gurres, a transferência imediata de 50 especialistas da Policlínica para as unidades básicas de saúde (UBSs), o que suspenderia por tempo indeterminado o atendimento a cerca de 90 mil pacientes com consultas e exames agendados.
A informação circulou desde a tarde de sexta-feira,31 de agosto, em grupos de WhatsApp na forma de mensagem que teria sido postada em um grupo interno da Policlínica pelo coordenador da unidade na quinta-feira. Sorocaba Plural tentou desde sábado, 1, um contato com o médico Paulo Roberto Gurres, sem sucesso. Entretanto, fontes ligadas à área da saúde e a vereadora Iara Bernardi (PT) haviam informado que a ordem de transferência existiu. “Recuaram todos diante da bobagem da Marina [Marina Elaine Pereira, secretária da Saúde]. Houve a ordem sim”, declarou Iara.
Pouco antes dela afirmar, o secretário de Comunicação e Eventos da Prefeitura de Sorocaba, Eloy de Oliveira, afirmara por WhatsApp que “a informação não procede”. Sorocaba Plural, diante disso, questionou: “Você afirma categoricamente que não houve a ordem de transferência imediata de 50 médicos da Policlínica para as UBSs? Essa mensagem que está circulando é falsa? Não há planos de transferência de médicos da Policlínica antes da terceirização?” Eloy novamente descartou a informação: “Sim, não haverá. Primeiro tem de haver a contratação de OSS” (referindo-se à terceirização da Policlínica para uma organização social na área da saúde).
A possibilidade de 90 mil pessoas ficarem sem atendimento por tempo indeterminado causou reações. O presidente do Sindicato dos Médicos de Sorocaba e Região (Simesul), Eduardo Vieira, declarou por WhatsApp a Sorocaba Plural, na noite de ontem, que a entidade “tomará as medidas jurídicas cabíveis” contra a transferência dos especialistas, e foi além: contrário à terceirização, Vieira afirmou que a entidade não tolerará que a Policlínica, hoje com os melhores especialistas da cidade e considerada uma referência, “seja entregue a entidades descompromissadas com a cidade, especialmente agora que começava a se reestruturar”.
“SUICÍDIO ADMINISTRATIVO”
A mensagem atribuída ao coordenador da Policlínica foi reproduzida pela página Legitimidade Sorocabana, mantida pelo vereador Hudson Pessini (MDB), no final da noite de sábado, com a observação: “A mensagem foi enviada para mim por várias fontes sérias, mas ainda me reservo ao direito de procurar o dr. Gurres na segunda-feira para me aprofundar no assunto.” Nem nesta publicação, nem em qualquer outro lugar, há notícia de que tenha havido um desmentido do coordenador da Policlínica, que fala em “suicídio administrativo” caso a transferência dos especialistas fosse efetivada.
A vereadora Iara Bernardi (PT) e o presidente do Simesul, Eduardo Vieira, tentaram um contato com o dr. Gurres na manhã deste domingo, sem sucesso. Iara não só contestou o desmentido oficial, como disse que havia conversado sobre o assunto com o coordenador da Policlínica na sexta-feira (31) e que ele estava “muito abalado” com a ordem recebida por intermédio da secretária de Saúde, Marina Elaine Pereira. “Se não houve a ordem, então o dr. Paulo está mentindo?”, questionou a vereadora. “A secretária Marina não conhece nada de uma área tão sensível como a Saúde e toma decisões sem o menor conhecimento das consequências”, opinou Iara.
Antes do desmentido da Secom, o presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba, Salatiel Hergesel, havia informado a Sorocaba Plural que o sindicato buscaria meios judiciais para impedir a remoção dos servidores. “A mudança de local de trabalho é possível desde que com motivação e necessidade comprovada. Que não é o caso, pois não ocorreu a terceirização e não há novos médicos para substituí-los”, disse Salatiel. Ele admitiu, entretanto, que não havia tido contato com o dr. Gurres e que recebera a mensagem de segunda mão, assim como o presidente da Associação dos Profissionais em Saúde de Sorocaba (APS), Alexandro Pereira.
TERCEIRIZAÇÃO JÁ COMEÇOU
O edital de chamamento às entidades interessadas em assumir a Policlínica em sistema de terceirização foi publicado em 23 de agosto pela Prefeitura, e as organizações interessadas têm até o próximo dia 24 para apresentar um plano de trabalho. A Prefeitura afirma que, com a Policlínica terceirizada, gastará menos e terá mais profissionais atuando na unidade – afirmação que é contestada pelos sindicatos e associações dos servidores, bem como pelo Conselho Municipal de Saúde. Diante da possibilidade de recursos no processo de escolha, é impossível afirmar quanto tempo pode levar para que a entidade escolhida assuma efetivamente os trabalhos. Até lá, conforme a informação oficial da Prefeitura, não haverá remoção de médicos da Policlínica para outros setores.
Conforme o presidente do Sindicato dos Médicos, Eduardo Vieira, “a decisão [de terceirizar] contraria a Conferência Municipal de Saúde que deixou claro que a terceirização não deve ser usada como política de saúde”. “E o parecer do Ministério Público foi enfático neste sentido. É uma medida arbitrária, vai contra o interesse e as finanças públicas. E desrespeita os cidadãos, o Legislativo e o Judiciário”, complementou, observando que após o lançamento do edital para terceirização da Policlínica a Prefeitura comprou novos equipamentos e até cadeiras para aquela unidade.
Nessa mesma linha se posiciona o presidente do Conselho Municipal de Saúde e também do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Milton Sanches. Segundo ele, o conselho tem sérias restrições às terceirizações, inclusive com base nas experiências já ocorridas em Sorocaba. “Nós temos duas terceirizações vindas da Prefeitura que nos dão trabalho até hoje. Uma é o Moriah, que não pagou os trabalhadores [do hospital Vera Cruz] até hoje, e a outra é a APGP, também do hospital Vera Cruz, que além de não pagar os trabalhadores, ainda ganhou mais um Caps [Centro de Atenção Psicossocial] aqui na cidade”, diz Sanches. “Quando falam em terceirização da saúde eu fico hiperpreocupado”, concluiu, informando que o Conselho Municipal de Saúde, apesar de ser totalmente contra a terceirização, acompanhará a transição da Policlínica para a iniciativa privada.
Sanches adiantou, também, que o conselho informará ao Ministério Público que o colegiado não foi sequer informado pela Prefeitura sobre o chamamento às organizações interessadas em assumir a Policlínica. “É uma total desconsideração com o Conselho Municipal de Saúde, que é um órgão deliberativo. Nós vamos acompanhar de perto, estamos informando ao MP tudo o que está acontecendo, e acompanharemos de perto, porque é preocupante”, finalizou.
A MENSAGEM POLÊMICA
Abaixo, a íntegra da mensagem atribuída ao coordenador da Policlínica, que circula na internet e que, segundo a Prefeitura, não procede. Ao publicá-la, Sorocaba Plural não endossa que seja autêntica ou não – fato que só o seu autor poderia elucidar –, mas permite que os leitores conheçam mais a fundo o assunto e tirem suas próprias conclusões. Sorocaba Plural informa, também, que a página está aberta a eventuais manifestações de pessoas e entidades envolvidas no tema, que queiram dar esclarecimentos ou contestar alguma das informações publicadas.
“Bom dia a todos.
Na quinta-feira foi-me passado pela secretária da Saúde a ordem vinda do prefeito, para que eu transferisse 50 dos médicos da Policlínica para as UBSs.
Declinei da ordem.
Considero um suicídio administrativo, pois em matemática simples, pelo número de horas que cada um faz e pelos meses que já temos agenda, seriam cerca de 90.000 pacientes a serem desmarcados e apenas desmarcados, pois ainda não há contrato de terceirização ou agenda que estes pacientes possam ser transferidos.
Marquei de segunda-feira me reunir com a secretária para definir a situação e tomar decisão.
Na mesma quinta-feira o Supremo [Supremo Tribunal Federal] tornou legal a terceirização de qualquer atividade no setor público e privado. Frente a isso, terceirização será inevitável.
Tenho duas opções de tomada de decisão na segunda-feira:
1- Peço exoneração do cargo por não concordar com essa ordem recebida.
2- Permanecer e tentar fazer essa transição, caso não haja outra opção, da melhor forma possível.
Devo tomar a primeira opção como decisão.
Paulo R. Gurres”
Fonte: Sorocaba Plural / Foto: Luiz Pollacco/Arquivo Secom/Prefeitura de Sorocaba