Os norte-americanos Jeffrey C. Hall, Michael Rosbash e Michael W. Young levaram o Nobel de Medicina e Fisiologia de 2017 por suas descobertas sobre o ritmo circadiano, o relógio biológico interno dos seres vivos.
Juntos, eles foram premiados com 9 milhões de coroas suecas (aproximadamente 3,5 milhões de reais). O prêmio foi anunciado na manhã desta segunda-feira (2) na Suécia, mas as pesquisas foram desenvolvidas nos anos 1980 a partir do estudo de moscas.
Os cientistas conseguiram isolar o gene que regula o ritmo circadiano, descreveram o funcionamento da proteína produzida por ele e mostraram um mecanismo de “feedback” responsável pela regulação de todo o sistema.
“Eles [ os laureados] desvendaram o mecanismo que controla a máquina do relógio biológico”, diz Ana Wedell, professora de Medicina Genética e membro do comitê do Nobel de Medicina.
O funcionamento do ‘relógio biológico’
O ritmo circadiano antecipa as mudanças do dia e ajusta nossas funções corporais. Por exemplo, mecanismos associados a esse sistema podem mandar um “aviso” para que o organismo aumente a sua temperatura interna quando está previsto que a temperatura do ambiente vai cair em determinada hora do dia.
Esse mecanismo também deflagra uma série de mudanças fisiológicas que nos leva, por exemplo, a ficar mais ativos durante o dia e menos alertas durante à noite. Níveis de hormônios e todo o metabolismo também se alteram a partir desse sistema.
“O mecanismo é importante na evolução. Com ele, ficamos um passo à frente do meio ambiente”, diz Ana Wedell.
Pesquisas mostraram mecanismo genético
Os premiados desse ano isolaram o gene que controla o ritmo interno dos seres vivos em 1984. Depois, mostraram que esse gene fornece informações para que o corpo fabrique uma proteína que se acumula nas células durante à noite e vai se degradando durante o dia.
Os cientistas também demonstraram que essa proteína ativa um sistema de feedback; ou seja, ela é capaz de controlar o gene que a codifica, ativando ou desativando a sua própria produção.
O achado respondeu a uma dúvida que há muito intrigava os cientistas: o mecanismo biológico que faz com que o corpo se adapte às diversas fases do dia geradas pela rotações da Terra.
A importância da descoberta para o funcionamento do corpo humano
Todo o organismo humano sofre influência do circuito claro-escuro. Nossa temperatura, nosso metabolismo, nossos hormônios e nosso sono reagem de acordo com essas mudanças. Portanto, desvendar esse mecanismo torna a medicina capaz de fazer intervenções em pessoas que possam ter disfunções nesse sistema.
Quando esse mecanismo está desregulado temporariamente; em um “jet lag”, por exemplo, nossa saúde e nosso bem-estar são afetados.
Pesquisas também demonstram que disfunções nesse sistema contribuem para o surgimento e agravamento de uma série de doenças; entre elas, a depressão.
Desde a descoberta dos cientistas, diversas pesquisas aprofundaram os estudos do ritmo circadiano. Vi-se que o estado de maior alerta está entre às 6h e às 12h, que o pico de temperatura do corpo se dá às 18h; que, à noite, o corpo começa a secretar um hormônio associado ao escuro chamado “melatonina”… dentre outras descobertas.
Três passos da ciência do ‘relógio biológico’ até o Nobel de Medicina
1) No século XVIII, o astrônomo Jean Jacques Mairan estudou plantas mimosa e demonstrou que as folhas da planta se abriam para o sol durante o dia e se fechavam no entardecer. Depois, Mairan colocou a planta em total escuridão e observou que, independente de estar dia ou não, as folhas continuavam a reproduzir o mesmo mecanismo.
2) Isso levou à conclusão de que o ritmo circadiano é um mecanismo endógeno (interno) — e não depende exclusivamente do “chamado” do meio ambiente. Outras pesquisas demonstram que o mecanismo se reproduzia em animais e seres humanos.
3) Depois, nos anos 1970, os pesquisadores Semour Benzer e Ronald Knopka perguntaram se era possível identificar genes que controlam o ritmo circadiano e demonstraram que mutações em um gene desconhecido provocava disfunções em moscas. O gene foi chamado de “period”.
Finalmente, os laureados de 2017 conseguiram identificar o gene e a proteína produzida por ele, que chamaram de “PER”. A pesquisa foi desenvolvida em 1984 e mostrou que os níveis de PER oscilavam nas 24 horas — o que era consistente com as mudanças das diversas fases do dia e, portanto, com o ritmo circadiano.
Quem são os laureados
Jeffrey C. Hall nasceu em 1945 em Nova York, EUA. Em 1971, terminou o seu doutorado na Washington University. Em 1974, passou a dar aulas na Universidade de Brandeis, nos Estados Unidos. Depois, em 2002, se associou à Universidade de Maine (EUA).
Michael Rosbash nasceu em 1944 em Kansas City (EUA). Em 1970, terminou o seu doutorado no MIT (Massachusetts Institute of Technology), nos Estados Unidos. Desde 1974, é professor na Universidade de Brandeis (EUA).
Michael W. Young nasceu em 1949 em Miami, nos Estados Unidos e fez o seu doutorado na Universidade de Texas (Austin), em 1975. Entre 1975 e 1977, fez pós-doutorado na Universidade de Stanford, na Califórnia. Desde 1978, ele dá aulas na Universidade de RockFeller, em Nova York.
Prêmios em outras áreas serão anunciados nos próximos dias
Medicina é sempre a primeira área premiada com o Nobel a cada ano. Nesta terça-feira (3), será anunciado o de Física, na quarta (4) o de Química, e na sexta (6) o da Paz. O de Economia será anunciado na segunda-feira da próxima semana (9).
Os vencedores são geralmente informados pelo júri no dia do anúncio oficial e não há uma lista de concorrentes disponível previamente, o que torna a divulgação sempre uma surpresa – embora haja favoritos.
Os últimos 11 laureados com o Nobel de Medicina:
2017: Os norte-americanos Jeffrey C. Hall, Michael Rosbash e Michael W. Young levaram o prêmio por suas pesquisas sobre o ritmo circadiano, o nosso relógio biológio interno.
2016: Yoshinori Ohsumi (Japão), por suas pesquisas sobre a autofagia, cruciais para entender como as células se renovam e a resposta do corpo à fome e às infecções.
2015: William Campbell (americano nascido na Irlanda), Satoshi Omura (Japão) e Tu Youyou (China), pelo desenvolvimento de tratamentos contra infecções parasitárias e a malária.
2014: John O’Keefe (EUA/Reino Unido) e May-Britt e Edvard Moser (Noruega), por suas pesquisas sobre o “GPS interno” do cérebro, que pode permitir avanços no conhecimento do mal de Alzheimer.
2013: James Rothman, Randy Schekman (EUA) e Thomas Südhof (Alemanha), por seus trabalhos sobre os transportes intracelulares, que ajudam a conhecer melhor doenças como a diabetes.
2012: Shinya Yamanaka (Japão) e John Gurdon (Reino Unido), por suas pesquisas sobe a reversibilidade das células-tronco, que permite criar todo tipo de tecidos do corpo humano.
2011: Bruce Beutler (Estados Unidos), Jules Hoffmann (França) e Ralph Steinman (Canadá), por estudos sobre o sistema imunológico que permite ao organismo humano defender-se contra as infecções, favorecendo a vacinação e a luta contra doenças como o câncer.
2010: Robert Edwards (Reino Unido), pioneiro da medicina reprodutiva, por sua contribuição ao desenvolvimento da fecundação in vitro.
2009: Elizabeth Blackburn (Austrália/EUA), Carol Greider e Jack Szostak (EUA), por suas descobertas sobre os mecanismos da vida e suas aplicações na luta contra o envelhecimento.
2008: Harald zur Hausen (Alemanha), Françoise Barré-Sinoussi e Luc Montagnier (França), por trabalhos sobre o câncer e a aids.
2007: Mario Capecchi (EUA), Oliver Smithies (EUA) e Martin Evans (Reino Unido), pela criação de ratos transgênicos que abriram um novo horizonte para as pesquisas de doenças como o Alzheimer ou o câncer
Fonte: G1
Foto: Divulgação/Twitter Prêmio Nobel