Os circuitos neuronais usados para nomear objetos ou animais são os mesmos ativados nos cérebros dos médicos na hora de diagnosticar uma doença ou prescrever um tratamento. Foi o que concluiu uma pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Os pesquisadores chegaram a esse resultado após avaliar o funcionamento cerebral de 31 clínicos por meio de exames de ressonância magnética funcional – tecnologia que permite detectar variações no fluxo sanguíneo em resposta à atividade neural.
“Também identificamos neste trabalho mecanismos que podem levar a uma conclusão diagnóstica prematura que pode contribuir para o desenvolvimento de ferramentas capazes de reduzir esse tipo de erro na prática médica”, disse o pesquisador do Laboratório de Informática Médica da FMUSP e autor do artigo, Marcio Melo.
Os participantes do estudo foram submetidos a dois diferentes experimentos. No primeiro, um conjunto de sintomas era apresentado por escrito e o médico tinha de identidicar a doença a ele relacionada.
Como comparação, eram exibidas informações sobre animais ou objetos a serem nomeados (miau, animal doméstico e pelo preto, por exemplo, sugeririam se tratar de um gato).
“É importante salientar que respostas com mais de um diagnóstico foram evocadas por 80,7% dos participantes pelo menos uma vez durante a execução das tarefas. Isso mostra que um processo complexo, como a evocação de diagnósticos diferenciais, pode ocorrer em poucos segundos”, comentou Melo.
Excesso de certeza
O ato de prescrever um tratamento é considerado pelo grupo da USP um processo de tomada decisão. A incerteza é grande no início, porém, à medida que as evidências vão se acumulando, um limiar de confiança é atingido e a decisão é tomada pelo médico.
Como contou Melo, as imagens de ressonância mostraram que quando os médicos deparavam com informações diagnósticas inespecíficas (que podem estar associadas a diversas doenças, como a febre) aumentava a atividade em um sistema cerebral conhecido como rede atencional fronto-parietal (RAFP).
Porém, se logo no início da tarefa era apresentada ao participante uma informação fortemente associada a uma doença – como um exame HIV positivo, por exemplo –, o monitoramento atencional pela RAFP era reduzido.
Análises sugerem, portanto, que a tomada de decisão pode ocorrer de forma prematura caso o médico, logo de início, tenha contato com uma informação de alto poder diagnóstico. Uma maneira de prevenir o encerramento prematuro da investigação seria apresentar ao médico, logo no início, uma lista de opções diagnósticas por meio de um sistema de suporte computadorizado.
Outra conclusão importante do artigo é que, aparentemente, os médicos só tomam consciência de sua decisão quando começam a verbalizá-la. Os médicos participantes do estudo necessitavam escutar as próprias respostas para tomar consciência das suas conclusões diagnósticas.
“Esse indício ainda precisa ser corroborado por experimentos que abordem especificamente essa questão e pode ter uma implicação mais ampla, ajudando a entender como as pessoas de forma geral tomam consciência do que estão pensando”, concluiu Melo.