A situação extremamente precária nas condições para o exercício da medicina no Hospital de Pronto Socorro de Canoas (HPSC), que atende a população de 150 cidades e é um dos maiores do Rio Grande do Sul, virou caso de Polícia. Faltam medicamentos corriqueiros para cuidar de pacientes, insumos básicos como luvas, gaze para curativos, copos descartáveis. Uma médica diz que falta clorexidina aquosa, item básico para higienizar feridas abertas. “Sem a clorexidina aquosa, a higiene é feita com álcool, que lesa tecidos e causa muita dor ao doente”, revolta-se a médica.
O Simers fez o registro policial como forma de “alerta às autoridades para que tomem providências cabíveis, pois no atual estágio do HPS a restrição no atendimento é a alternativa que melhor se adequa”, diz a diretora do Sindicato Médico Clarissa Bassin, que foi ao local. O HPSC atende mais de 10 mil casos por mês de urgências e emergências, como foco em traumas em geral e traumato-ortopedia.
Na segunda-feira, 3 de abril, o Simers comunicará a situação ao Ministério Público Estadual e Conselho Regional de Medicina (Cremers), diante “da falta de condições para o atendimento médico e assistência em geral”. “Estamos falando de um hospital que opera em uma condição inadmissível. Vamos cobrar da prefeitura a fiscalização imediata da gestão do Grupo de Apoio à Medicina Preventiva e à Saúde Pública (Gamp), organização privada que assumiu em dezembro passado”, informa Clarissa. “As falhas, a falta de materiais e tudo que relatamos na ocorrência policial colocam em risco as vidas que chegam ao HPSC para serem salvas e não para serem expostas à tamanha insuficiência”.
Problemas vão de remédios à falta de sacos mortuários
A lista de problemas é interminável e foi registrada em detalhes na ocorrência policial pelo Sindicato Médico. Entre os medicamentos em falta, estão Sinvastatina, Metoprolol, Enalapril, Atroveran, Buscopan, Paracetamol, Dipirona Gotas. Também há problemas de suprimento de espaçadores e extensores para tratar crianças com crises de asma, abocath (cateter sobre agulha), agulha para raquianestesia, além de luvas de procedimento, bobinas de papel para exames de eletrocardiograma, papel para impressão de exames e diagnósticos, entre outros materiais.
Uma situação deplorável e também foco de risco e contaminação é a falta de sacos mortuários. Segundo médicos, os cadáveres saem do morgue para a área do estacionamento externo sem serem cobertos, completamente expostos. “Não temos sequer lençóis para cobri-los”, disse uma médica ao Simers. “As roupas de cama e para uso dos médicos e enfermeiros, jalecos e aventais não são em número suficiente para a troca diária”, observa um médico, que saiu do centro cirúrgico com avental sujo de sangue e precisou permanecer com ele, pois não tinha outro disponível para trocar. A rouparia ainda é a mesma do gestor anterior, o Grupo Mãe de Deus.
“Que economia é esta? É inacreditável o nível de precariedade para um hospital com este porte e relevância na rede de atendimento, pois se trata de Pronto Socorro”, adverte Clarissa Bassin. Os depoimentos se sucedem sobre os problemas diários, dos mais graves aos mais simples de serem resolvidos, como o relato a respeito das várias lixeiras de infectantes que estão com o pedal quebrado, obrigando os médicos e enfermeiros a levantar a tampa com as mãos, o que se torna foco de contaminação. Desde que a Gamp ingressou na gestão, a situação se agrava e, nas últimas semanas, piorou. Também há irregularidades na relação de trabalho. Os profissionais são pressionados a pedir demissão, com a promessa de serem recontratados como pessoa jurídica, abrindo mão inclusive de multa rescisória.