De acordo com o Conselho Federal de Medicina, do total de médicos no país, 42,5% são mulheres. Um história de dedicação à profissão que começou em 1875, quando Maria Augusta Generoso Estrela iniciou a busca do título de primeira médica do Brasil.
No dia Internacional da Mulher, a Federação Médica Brasileira (FMB) resgata a história de Maria Augusta Generoso Estrela, a primeira médica brasileira. Nascida em abril de 1860, no Rio de Janeiro, Maria Augusta recebeu seu diploma de médica em 1881, no New York Medical College and Hospital for Women.
O envolvimento com a medicina iniciou quando Maria Augusta tinha 13 anos. No retorno de uma temporada de estudos em Portugal, o navio que viajava chocou-se com outro. A jovem teve dedicado envolvimento com o salvamento da tripulação e passageiros do navio avariado. O fato teve repercussão internacional e ao desembarcar no Brasil, Maria Augusta foi homenageada pelo heroísmo, não somente pelos oficiais ingleses do navio, mas também por seus conterrâneos.
Em 1874, Maria Augusta voltou ao internato no Colégio Brasileiro e entre suas leituras, a de uma jovem que estudava medicina em Nova Iorque, lhe chamou a atenção. Aquela era uma época em que as faculdades de Medicina não permitiam o ingresso de mulheres. Maria Augusta insistiu com o pai para estudar no exterior e, em 1875, partiu para Nova Iorque, onde requereu prestar exames na New York Medical College and Hospital for Women. O pedido foi indeferido porque os estatutos exigiam idade mínima de 18 anos para o ingresso na faculdade – ela tinha 16. Sem desanimar, Maria Augusta conseguiu expor para médicos, médicas e alunas da instituição os motivos que a levaram a cursar medicina. A jovem sensibilizou os membros da congregação, que autorizaram ela a participar dos exames. Foi aprovada com distinção e em 17 de outubro de 1876, matriculou-se no curso de medicina.
Durante seus estudos, a empresa de seu pai faliu e ele não tinha mais condições de mantê-la em Nova Iorque. O imperador D. Pedro II, que acompanhava a história da jovem brasileira, ordenou por meio de decreto, a constituição de uma bolsa suficiente para pagar a faculdade e cobrir os gastos gerais da estudante.
Maria Augusta concluiu o curso em 1879, mas novamente, teve problemas com a idade: tinha menos anos de vida do que o exigido pelos estatutos da faculdade para receber o diploma. Talvez inspirado na história da brasileira, D. Pedro II abriu neste ano as instituições de ensino superior às mulheres no país, iniciando assim o rompimento de um preconceito social de que as jovens que seguiam esse caminho ficavam sujeitas a pressões e a desaprovação social.
Durante a espera do diploma, Maria Augusta frequentou cursos e estagiou em vários serviços médicos de Nova Iorque. Em 1881, fundou o jornal “A Mulher” com sua amiga Josefa Águeda Felisbella Mercedes de Oliveira, que era estudante de medicina e que mais tarde seria médica em Pernambuco. Em um dos números desse periódico, “consagrado aos interesses e direitos da mulher brasileira”, elas escreveram o artigo “A mulher médica”, em que defendem o direito feminino de exercer a medicina. Neste mesmo ano, Maria Augusta recebeu o diploma de Médica e foi agraciada com uma medalha de ouro pelo desempenho durante o curso e por sua tese: Moléstias da Pele. Permaneceu mais um ano nos Estados Unidos e em seu retorno ao Rio de Janeiro, comprometeu-se com D. Pedro em dedicar seu atendimento às mulheres.
Segundo a biógrafa Yvonne Capuano, “Maria Augusta submeteu-se aos exames na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro para validar seu diploma, conforme determinava a Reforma de 1832. Não haveria obstáculos, pois estudara e estagiara o suficiente para não temer uma banca examinadora. Dominava quatro idiomas: inglês, francês, espanhol e alemão, e estava preparada para a arguição. Encontrou nessa ocasião, várias alunas matriculadas no curso de medicina, pois as portas do ensino haviam sido aberta em 1879 às jovens brasileiras. Sentiu-se gratificada pelo sacrifício e luta de anos, distante do Brasil”.
Com o diploma validado, passou a clinicar e servir de exemplo para que outras jovens se matriculassem em cursos superiores.
Em 1884, conheceu e casou-se com o farmacêutico alagoano Antônio Costa Moraes, com quem teve cinco filhos. Nessa época, mantinha um pequeno consultório e combatia contra o marido ciumento que muitas vezes tentou fazê-la largar a profissão. Firme nas decisões, continuou clinicando, mas, para tranquilizá-lo, passou a fazê-lo numa das salas da farmácia, onde várias receitas eram formuladas por ela. Maria Augusta dedicava-se às mulheres e às crianças e atendia gratuitamente aos que não tinham possibilidade de remunerá-la.
A médica ficou viúva em 1908, quando reduziu sua rotina de atendimento para dedicar-se aos filhos. Sem nunca abandonar os estudos e o contato com os clientes, era chamada para discutir entre colegas um caso de difícil diagnóstico, o que conseguia com brilhantismo e facilidade. Lia assiduamente, sendo esse o seu passatempo predileto.
Manteve-se lúcida até falecer subitamente, em 18 de abril de 1946, aos 86 anos, enquanto conversava com a família. Maria Augusta deixou um importante lugar na história da medicina e na defesa dos ideais femininos.
Seu nome é honrado como patrono da cadeira no 64 na Academia de Medicina de São Paulo. Dá nome a uma rua na cidade de Poços de Caldas (MG) e a uma rua na cidade de Porto Alegre (RS).
Fontes:
Academia de Medicina de São Paulo
Associação Brasileira de Mulheres Médicas
CFM – Demografia Médica Brasileira
A ruptura do mundo masculino da medicina: médicas brasileiras no século XIX – Elisabeth Juliska Rago