Quem encontra hoje o aposentado Ivo Nunes de Siqueira, de 77 anos, com seu jeito tranquilo, alegre e cheio de histórias para contar, não acredita que ele passou cerca de 50 dias internado por causa de problemas cardíacos, entre eles uma estenose aórtica, que é a abertura incompleta da válvula aórtica.
“Mas agora estou zero bala”, comemora. Contudo, além de recuperar sua saúde, ele também fez parte de um momento importante para a medicina em Mato Grosso, pois foi o primeiro paciente do estado submetido a uma cirurgia transapical, um procedimento delicado para troca da válvula aórtica através de um cateter inserido pela ponta do coração.
A cirurgia, que foi efetuada pela equipe de cirurgiões cardíacos do Hospital Santa Rosa, consistiu em um pequeno corte, de cerca oito centímetros, no lado esquerdo do peito, através do qual foi possível alcançar a ponta do coração e então implantar a nova válvula.
O processo é realizado sem necessidade de parar o coração e de usar circulação extra-corpórea, como aconteceria em uma cirurgia cardíaca convencional.
“Sou extremamente grato a Deus, a minha família e a todos os profissionais envolvidos na minha recuperação. Também me sinto honrado em ter sido o primeiro submetido a essa cirurgia. A evolução da medicina é fantástica e hoje podemos ter acesso a muitas tecnologias aqui mesmo em Cuiabá, sem precisar ir para outro estado ou até outro país”, afirma. Seu Ivo conta que após se aposentar, em 1995, começou a ter uma série de problemas de saúde.
“Tive o meu primeiro infarto em 1996. No ano seguinte precisei ir para São Paulo operar o coração. Em 1999 sofri um AVC. Desta última vez, sentia muita falta de ar e vim para o hospital porque estava com meu pé muito inchado, logo suspeitaram de erisipela. A médica plantonista achou melhor me internar e, após alguns dias e alguns exames, foi diagnosticada a estenose aórtica”.
Adepto do espiritismo, Ivo diz que tudo acontece por um propósito e se passou por todos esses percalços, é porque sua missão ainda não acabou. Dois anos atrás, ele e sua esposa ficaram internados juntos para tratar complicações decorrentes da diabetes.
“Diziam que o meu estado era muito mais grave que o dela. Mas ela logo faleceu e eu me recuperei. Em todos esses momentos eu entrego a minha vida à Deus, pois sei que estou aqui só de passagem e é Ele quem sabe o nosso destino”.
Seu Ivo tem três filhos e sete netos, é advogado e trabalhou por mais de 38 anos como Procurador Federal e Fiscal de Caça e Pesca do IBAMA. Ele já recebeu alta e nesse novo capitulo da sua vida quer se dedicar à sua família, ao Direito e à Seleta Sociedade Caritativa e Humanitária.
Cirurgia
O ineditismo do procedimento exigiu a participação do renomado médico italiano Davide Gabbieri, cirurgião cardíaco especialista em cirurgia da válvula aórtica transapical.
“Vim da Itália especialmente para auxiliar a equipe na execução do procedimento. Espero que o Hospital Santa Rosa seja brevemente reconhecido como referência nesse tipo de cirurgia, pois oferece menor mortalidade e aumenta a qualidade de vida de pacientes com estenose na valva aórtica cuja cirurgia não é recomendada”, destacou.
A cirurgia transapical ou transcateter foi desenvolvida para possibilitar o tratamento de pacientes com estenose aórtica não candidatos à cirurgia cardíaca convencional. Foi realizada pela primeira vez em seres humano em 2002 pela virilha e em 2004 através da ponta do coração.
Somente em 2008 o Brasil passou a utilizar estas tecnologias e hoje o Mato Grosso já as realiza. Para o cirurgião cardiovascular do Hospital Santa Rosa, Alex Celullare, a cirurgia convencional é o procedimento padrão para o tratamento da doença, sendo a técnica transapical indicada para casos excepcionais
“O paciente Ivo já havia sido submetido a uma cirurgia de revascularização do miocárdio e apresenta diversos fatores que impediriam uma cirurgia cardíaca convencional, como uma importante calcificação em toda a sua aorta. Além disto, é portador de aneurismas de aorta abdominal, fato que impedia que o procedimento fosse realizado pela virilha. A única opção para ele era implantar a nova válvula por meio da cirurgia transapical”, detalhou Celullare.
A estenose aórtica pode provocar uma gama de sintomas que variam de desmaios, dor no peito a quadros de insuficiência cardíaca. É a doença valvar mais comum entre os idosos, com prevalência estimada de 5% para aqueles com mais de 75 anos de idade e a sobrevida média é de dois a três anos.
Fonte: Midia News