Um dos episódios da vida que tem motivado a geração de intermináveis conflitos entre herdeiros é a sucessão, em decorrência da morte de um dos membros da família, que consiste no processo de transferência dos bens, direitos e obrigações que compõem o patrimônio (herança) formado pelo falecido ao longo da vida.
De acordo com o disposto no artigo 1.784, do Código Civil, com a ocorrência da morte, a herança transmite-se imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários, formando-se um condomínio em que todos os herdeiros passam a ser titular de direitos e obrigações em relação a esse patrimônio, até que ocorra a partilha no âmbito do processo de inventário. Porém, tendo em vista a diversidade de bens que integram a herança e a pluralidade de herdeiros, é quase que impossível encontrar-se um denominador comum capaz de alinhar os diversos interesses envolvidos, eis que praticamente inviável a atribuição de bens específicos para cada herdeiro, ainda mais quando o patrimônio é constituído também por empresas, e a venda e apuração dos respectivos valores nem sempre é a alternativa mais adequada. A partir daí começam a surgir as desavenças no seio familiar, provocadas geralmente por vaidades, arrogâncias, intolerâncias, busca pelo poder etc., discórdias muitas vezes originadas no convívio durante a infância ou adolescência, que acabam alongando-se por toda a vida, contribuindo decisivamente para a ocorrência de desgastantes e infindáveis disputas entre os herdeiros, cabendo ao juiz, nesta hipótese, resolver tais conflitos, nem sempre adotando a melhor solução para o caso concreto.
Além destas circunstâncias relacionadas aos aspectos pessoais do processo sucessório, também vale lembrar que a carga tributária incidente no País é extremamente exagerada, alcançando um nível que há muito tempo não respeita a capacidade contributiva dos contribuintes, fruto da má gestão dos recursos pela administração pública (federal, estadual e municipal), fazendo com que a gula arrecadatória torne-se insaciável, sujeitando os contribuintes a sucessivos aumentos de tributos. Apenas para confirmar essa constatação, revela-se oportuno registrar que o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão que reúne os secretários estaduais de Fazenda do país, aprovou, em 2015, o encaminhamento de minuta de resolução ao Senado com proposta de elevação da alíquota máxima do Imposto sobre Transmissões Causa Mortis e Doações – ITCMD, que incide nas transferências de propriedade de bens, de 8% para 20%.
Daí a importância do planejamento sucessório, que consiste na adoção de estratégias jurídicas destinadas a organizar o patrimônio familiar visando minimizar os riscos decorrentes de conflitos que podem ocorrer no processo sucessório, protegê-lo das imprevisões inerentes ao exercício da atividade empresarial, bem como obter eficiência tributária.
Nesse sentido, várias ferramentas se prestam para estruturar o planejamento sucessório, como, por exemplo: escolha do regime de bens do casamento dos herdeiros, doação em vida, adiantamento de herança (legítima), testamento, constituição de sociedade holding familiar, acordo de sócios, fundos de investimento, planos de previdência privada, dentre outras estratégias.
É importante salientar que o planejamento sucessório exige a adoção de estratégias personalizadas, levando em consideração o perfil e os interesses dos membros da família, a estrutura do patrimônio familiar, a sua exposição de risco, dentre outros aspectos indispensáveis para a sua implementação, razão pela qual deve ser planejado e executado por profissional reconhecidamente capacitado, que detenha amplo conhecimento jurídico dos aspectos familiar, societário e tributário envolvidos nesse tipo de projeto, e com capacidade para fomentar a obtenção de decisões de consenso entre os membros da família, pois somente assim o planejamento sucessório cumprirá a sua função primordial de garantir a paz e o bem-estar da família e a perpetuidade do patrimônio familiar, tornando efetivo o pensamento de Albert Einsten, no sentido de que: “A paz não pode ser mantida à força. Somente pode ser atingida pelo entendimento”.
Rodrigo Machado Leal é advogado da Assessoria Jurídica do Sindicato dos Médicos de Santa Catarina
Foto: Rubens Flôres